Causas incomuns de hepatite aguda: infecção urinária

José Carlos Ferraz da Fonseca

Médico-especialista em doenças do fígado (Hepatologia)

Como sabemos, o fígado é agredido, no dia-a-dia, por inúmeros agentes, sejam de origem interna ou externa. Quando agredido, podemos observar formas agudas ou fulminantes de hepatite. Vários agentes podem ser incriminados, dentre estes, por grau de importância: hepatite aguda pelos vírus das hepatites A, B, C, D e E; reações a drogas lícitas (álcool, paracetamol); uso de determinadas plantas medicinais (sacaca, celidônia, erva-carvalhinha, poejo, erva-de-passarinho, kava-kava, chá verde, herbalife); drogas contra tuberculose; antibióticos; antidepressivos; drogas antirreumáticas e ilícitas (cocaína, crack, anfetamina-ecstasy); substâncias tóxicas (solventes industriais; derivados do petróleo, como a nafta). A ingestão abusiva de bebidas alcoólicas destiladas (cachaça, vodca, conhaque) agride tanto o fígado, que o paciente pode morrer por falência total deste órgão. Em um terço dos casos, não é possível descobrir a causa ou causas que levaram o fígado a desenvolver hepatite aguda.

Dentre as causas de hepatite aguda sem etiologia (causa) definida, a infecção urinária, doença frequente entre mulheres (uretra curta e próxima à vagina e ao ânus), deve ser sempre lembrada pelo médico assistente. O leitor, neste momento, deve estar questionando o fato e perguntando-se: como que uma infecção urinária pode ocasionar hepatite aguda? É fácil explicar. A bactéria, citando como exemplo a Escherichia coli (bactéria mais frequente na infecção urinária), inicialmente, alojada na uretra e, posteriormente, na bexiga e rins (via ascendente), migra (desloca-se) para a corrente sanguínea (via hematogênica), ganha o sistema da veia porta (fora do fígado) e penetra pela própria veia porta no fígado. Ao alojarem-se preferencialmente no lobo direito do fígado, milhares de bactérias colonizam-se nas células hepáticas, liberam produtos tóxicos (toxinas) que ocasionam dano celular hepático e, consequentemente, necrose aguda (destruição) do tecido. Durante a vida adulta, 40 a 50% das mulheres experimentam uma infecção urinária. Aí começa o problema.

Inicialmente, a infecção urinaria caracteriza-se clinicamente por vários sinais ou sintomas, que podem cursar associados ou separadamente, tais como vontade emergente e contínua de urinar; dor, ardência ou queimação ao urinar; dificuldade no ato de urinar; presença de sangue na urina; dor suprapúbica; febre; calafrio; tremores; dor de cabeça; dor nas costas, enjoos e vômitos. Geralmente, entre o segundo e o terceiro dia do início da infecção, a urina escurece (cor de Coca-Cola ou guaraná), os olhos e a pele tornam-se amarelos (icterícia), observando-se também a exacerbação da febre e dos vômitos.

Na hepatite aguda de origem bacteriana, denominada, no meio médico, como hepatite aguda transinfecciosa, os sintomas e sinais clínicos são os mesmos observados nas hepatites agudas de etiologia viral. A única diferença consiste nas queixas urinárias, como descrevemos anteriormente. Os exames laboratoriais revelam, no sangue, o mesmo que se observa na hepatite aguda por vírus: aumento da transaminases, aumento das bilirrubinas. Se diagnosticada e tratada (antibióticos) corretamente, a cura ocorre em 99,9% dos casos. Todavia, se não diagnosticada, problemas mais sérios podem ocorrer ao paciente. Quais seriam esses problemas? A persistência da infecção bacteriana no trato urinário e no sangue pode levar ao quadro de sepse (infecção generalizada), ocasionando microabscessos no fígado, que, posteriormente, coalescem, assim, formando abscessos maiores em todo fígado (abscessos hepáticos piogênicos). O quadro, na maioria das vezes, é muito grave, podendo ser indicado drenagem cirúrgica dos abscessos.

O quadro clínico do abscesso hepático piogênico (bacteriano) em decorrência da infecção urinária é mais exacerbado e, além dos sintomas infecciosos (febre, enjoos, vômitos, icterícia), os pacientes queixam-se de muita dor na região do abdome superior (localização do fígado), descrevendo tal dor como se fosse uma facada. A falta de ar pode ocorrer quando o pulmão é acometido, principalmente, por acúmulo de água (derrame pleural).

É bom frisar aos leitores deste blog que o seu médico assistente é a única pessoa capaz de diagnosticar o quadro de infecção urinária com comprometimento hepático. Se mulher, e após urinar, use o papel higiênico de frente para trás, sempre. Nunca o inverso, pois isso pode levar agentes infecciosos (bactérias, fungos) do ânus para a vagina, aumentando o risco de infecção.

Nunca “ache” que você é portador de tal doença se automedicando, nunca use antibióticos sem prescrição médica e, do mesmo modo, não use drogas anti-inflamatórias (somente devem ser utilizadas em processos inflamatórios e não-infecciosos) sem a devida indicação.

Varizes esofágicas

“O fígado é ainda um daqueles assuntos sobre os quais nós sabemos mais do que realmente é verdade”,
Kurt Aterman (1963).

Varizes esofágicas


José Carlos Ferraz da Fonseca

Médico especialista em doenças do Fígado (Hepatologia)



Na foto ao lado (setas verdes) observa-se cordões varicosos (varizes esofágicas). Imagem livremente obtida através da publicação de Hideaki Kodama e cols (




























































AJR 2009; 192:122-130).

Pacientes portadores de cirrose hepática apresentam varias complicações relacionadas com o processo evolutivo da doença. As principais complicações seriam: barriga-d’água (ascite), hipertensão portal (complicação progressiva da cirrose hepática), sangramentos, infecções, desorientação (encefalopatia hepática) e outras mais. Das que mais preocupam os médicos, as varizes esofágicas ocupam sempre o primeiro lugar.

O que são varizes esofágicas e porque essas aparecem no cotidiano do paciente cirrótico. A cirrose, estágio final da doença hepática crônica, é a causa mais comum do aumento acentuado da pressão venosa do sistema portal, denominada como hipertensão portal. Assim, podemos conceituar hipertensão portal como: aumento da pressão entre a veia porta e a veia hepática (> 6mmHg). Portanto, se as veias do sistema porta aumentam por pressão, as veias contidas na parede do esôfago e estomago dilatam-se e podem ocasionar ruptura.

São excepcionalmente raras as complicações clinicas da cirrose hepática que não estão diretamente relacionadas com a hipertensão portal. Pacientes cirróticos em estágio inicial não apresentam durante a consulta médica, sinais e sintomas que possam sugerir o diagnostico de hipertensão portal.

A hipertensão da veia porta pode ser classificada como: pré-hepática, que caracteriza-se pelo aumento da resistência nas veias porta ou esplênica (formação de trombos, compressão tumoral); hepática (cirrose, esquistossomose, hepatite alcoólica, toxinas); pós-hepática (doenças cardíacas, trombose).

Como sabemos, a principal complicação da hipertensão portal é a ruptura das varizes esofágicas, principalmente entre pacientes com cirrose hepática descompensada (albumina baixa, infecções, barriga d’água, encefalopatia hepática, uso de drogas para disfunção erétil). Quando ocorre tal ruptura, observa-se hemorragia digestiva. O quadro de hemorragia pode ser discreto ou exacerbado. Quando discreto, ocorre o relato de fezes escuras pelo paciente. Se exacerbado, o paciente tem inicialmente enjoos (acumulo de sangue vivo no estomago) e depois vomita sangue (hematêmese), que pode ser vivo ou coagulado. Outro sinal é a presença de sangue nas fezes (melena).

A endoscopia digestiva alta é o melhor método de diagnóstico para a detectação das varizes esofágicas e gástricas. Estudos revelam que 40% dos pacientes cirróticos compensados apresentam varizes no esôfago. Entre cirróticos descompensados, o percentual é bem maior, em torno de 60%.

No exame endoscópico, o calibre das varizes revela o grau de gravidade. O exame endoscópico permite medir a pressão das varizes, tratar varizes sangrantes ou não (ligadura ou esclerose das varizes). Se o calibre é fino, não indicamos qualquer procedimento terapêutico, apenas monitoramos. Se as varizes são de médio ou grosso calibre, temos como conduta profilática indicar a devida ligadura ou esclerose por endoscopia.

No tratamento das varizes esofágicas podemos utilizar varias drogas, tentando reduzir a pressão da veia porta. Porém, só indicamos o tratamento com drogas se ocorrer sangramento prévio. É importante frisar que após o primeiro episodio de sangramento varicoso, a probabilidade de ressangramento é bastante elevada, variando e 40% a 70% dos casos. Quando ocorre ressangramento, a mortalidade é muito alta.

O que podemos concluir com este artigo? Na minha clinica diária, ao diagnosticar um paciente com cirrose hepática, independente da causa, sempre indico estudo endoscópico digestivo, método este que dá ao médico assistente bastante segurança, evitando assim surpresas desagradáveis no dia-a-dia. Se o prezado leitor é cirrótico, compensado ou não, procure trimestralmente seu médico, pois só assim você evitara complicações maiores referentes à sua doença. A hemorragia digestiva por ruptura das varizes esofágicas é a meu ver, a mais dramática situação de urgência em que um ser humano enfrenta, seja ele o paciente, familiar ou o médico que o atende.

Recomendamos aos pacientes portadores de varizes esofágicas o que se segue: procure seu médico pelo menos duas vezes por ano (paciente com varizes de esôfago geralmente exige um acompanhamento permanente); fezes escuras tipo “borra de café”, podem ser o primeiro sinal de ruptura das varizes; evite deglutir alimentos cortantes (torradas ou bolachas); alimente-se de pequenas porções e mastigue bem; evite alimentos rugosos (ervilha de grão rugoso, milho, pipoca); fuja de drogas para disfunção erétil (Viagra ou Cialis); se usar bebida alcoólica, esqueça, pois o álcool é um doce veneno para o cirrótico; tenha cuidado com o aumento brusco da pressão intra-abdominal, como um espirro, um ataque de tosse, ou um esforço ao defecar, pois pode provocar rompimento das varizes.
Recomendações gerais para pacientes com hepatite crônica ou cirrose hepática pelo vírus da hepatite B (VHB).


José Carlos Ferraz da Fonseca

Especialista em Doenças o Fígado (Hepatologia)

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Recomendações

1. Você precisa monitorizar seus testes de função hepática (sangue) cada 6-12 meses.

2. Informe ao seu médico e dentista que você tem o vírus a hepatite B (VHB).

3. Se você é homem, tem mais de 40 anos, solicite de seu médico ultrassonografia (abdome superior) a cada 6 meses. Lembre-se, é a melhor maneira de detectar câncer de fígado.

4. Se você é mulher, tem mais de 50 anos, solicite ao seu médico ultrassonografia (abdome superior) a cada 6 meses. É a melhor maneira de detectar precocemente câncer de fígado.

5. Se você precisa tomar drogas imunossupressoras ou corticoides, consulte o seu hepatologista antes de tomar tais medicações.

6. Se você tem febre ou dor, pode usar acetaminofen (paracetamol), nunca mais que quatro gramas (4000mcg) dia.

7. Se você gosta de bebidas alcoólicas ou se você tem cirrose hepática, nunca use mais que duas gramas (2000mcg) de acetaminofen (paracetamol) por dia.

8. Seus utensílios domésticos e de higiene são de seu exclusivo uso, evite compartilhá-los.

9. Evite viajar para áreas endêmicas de hepatite Delta (Amazônia Ocidental Brasileira, parte da Colômbia, Venezuela e Peru).

10. Se você é cirrótico, gostaria de lembrá-lo:
a) Não beba álcool;
b) Não fume;
c) Não tome aspirina ou antiinflamtorios não esteroides;
d) Não tome sedativos para dormir, narcóticos ou drogas antitussígenas (codeína);
e) Evite uso de sal na sua comida;
f) Evite certos tipos de antibióticos (azitromicina, tetraciclina, aminoglicosideos);
g) Se você precisa fazer qualquer tipo de cirurgia, converse com o seu médico hepatologista.
h)Se você tem varizes, principalmente esofágicas, nunca tome VIAGRA.
i) Se você notar que suas fezes estão escuras ou enegrecidas, procure imediatamente seu médico assistente.
j) Procure se vacinar contra hepatite A e contra gripe.
k) Qualquer infecção deve ser tratada imediatamente.

Bibliografias recomendadas:

Ko, HH; Wong DKH and Heathcote J. Management of Hepatitis B. Clinical Gastroenterology and Hepatology 9: 385-391, 2011.

O dia-a-dia dos pacientes com cirrose hepática

José Carlos Ferraz da Fonseca

Médico especialista em Doenças do Fígado (Hepatologia)

Dando continuidade aos artigos publicados neste blog sobre cirrose hepática, podemos dizer que, se o paciente cirrótico encontrar-se em fase bem avançada da doença e, mesmo assim, tiver o prazer de comer e de ingerir exageradamente alimentos constituídos de proteína animal (carne vermelha, ovo, manteiga, queijo amarelo, leite animal), existe a possibilidade do mesmo entrar em estado de confusão mental.

Elementos que fazem parte das proteínas animais, quando ingeridos e degradados no intestino, produzem uma substância chamada amônia, substância esta que vai impregnar o cérebro e é responsável pela estado de confusão. Este estado é conhecido no meio médico como encefalopatia hepática. O quadro tende a iniciar-se com a presença de sonolência diurna e insônia noturna, mudança de comportamento e conduta inadequada, alterações na escrita que impossibilita assinar-se o próprio nome.

A maioria dos pacientes perde a noção de espaço (não sabem onde estão e são capazes de urinar nas cestas de lixo, pia ou no guarda-roupa) e fica totalmente desorientada no tempo (esquecem tudo o que se relaciona com dia, semana, ano, números, etc.). Alguns pacientes perdem totalmente a memória e são incapazes de lembrarem seu nome. Pacientes pacíficos se convertem em indivíduos eufóricos, irritadíssimos, inquietos, apresentam conduta infantil e a agressividade fica muito patente nestes pacientes (alguns são erroneamente internados em clínicas psiquiátricas). Outros, pelo contrário, tornam-se muito passivos e são incapazes de reagir a qualquer estímulo, seja verbal ou físico. É comum que familiares telefonem e digam: “Doutor, o papai está de novo com aquela bobeira ”.

Sempre indicamos aos pacientes com cirrose hepática dieta baseada em proteínas vegetais e damos ênfase a produtos essencialmente brasileiros e amazônicos tais como: castanha regional, tucumã, pupunha, abricó, abacate, manga, ingá e outros mais. Por outro lado, é injustificável a restrição total de gorduras na dieta do cirrótico. O tabu de que as gorduras aumentam o trabalho do fígado e, assim, o seu desgaste funcional carece totalmente de fundamento científico. Sabe-se de antemão que 75% dos pacientes cirróticos são desnutridos em decorrência da própria doença (são anoréticos) e em conseqüência das inúmeras restrições dietéticas impostas por leigos, familiares, compadres e vizinhos. È sempre aquela mesma história não pode comer isso ou aquilo, pois tudo faz mal. A gordura sem excesso é uma fonte energética do organismo. Nesses pacientes indico como fonte energética vegetal (constituída de gordura monosaturada e não faz mal) os seguintes produtos: leite da castanha regional ou do Pará, tucumã, pupunha e leite de coco. Por outro lado, contra-indicamos qualquer tipo de gordura animal (bacon, pele de galinha ou de pato, gordura da picanha, carne seca). Peixe gordo pode comer, não faz mal, menos frito, certo?

Depois da carne vermelha e de gordura animal, o ato de proibir o consumo exagerado de sal aos pacientes cirróticos é um dos maiores problemas que o médico encontra na clinica diária. Do “ponto de vista” não-médico, qualquer comida sem sal, principalmente o peixe (sempre indicado ao paciente com cirrose), é intragável, sem gosto, apesar de sabermos o mal que o consumo exagerado do sal faz, principalmente para os que têm o fígado sadio e mais de quarenta anos de idade. É bom lembrar ao prezado leitor que a maioria dos índios ao se “socializar” ou como chamo, “salsocializar”, tornam-se hipertensos por comerem sal. O consumo de mais de três gramas (duas pitadas generosas) de sal por dia pode representar ao cirrótico em fase avançada da doença o que se segue: aumento do inchaço (edema) nas pernas (principalmente nos tornozelos), a barriga cresce e fica cheia de liquido (ascite) e os pulmões podem ficar comprometidos pela presença de líquidos (derrame pleural).

A piora do quadro clinico de um paciente com cirrose pode ser provocada por uma dieta errada ou por infecções bacterianas, fato muito comum observado entre esses pacientes. Um número significativo de pacientes cirróticos desenvolve a popular “vermelha” (erisipela) nos membros inferiores ocasionado por infecções bacterianas em decorrência da má circulação venosa, que é provocada pelo mau funcionamento do fígado. É mais um dos cuidados que os familiares dos pacientes com cirrose têm que ter. Qualquer sinal de “vermelha” nas pernas do seu familiar, leve-o ao médico imediatamente, pois aquele pode desenvolver confusão mental e entrar em coma. Levar o paciente para a rezadeira não vai adiantar, as bactérias são agnósticas e o que cura mesmo é o antibiótico prescrito pelo médico.

Se você, caro leitor, tem na família ou conhece alguém, por exemplo, com cirrose hepática, mantenha-se vigilante na dieta prescrita pelo médico e fique atento para detectar os sinais e sintomas. O diagnóstico precoce no ambiente familiar pode ajudar, e muito, o seu familiar, conhecido ou amigo. Por outro lado, caro leitor, se você tiver cirrose hepática já diagnosticada, siga corretamente o que o seu médico recomenda, pois alguém poderá contar sua história quando você entrar em crise.
Novas drogas no tratamento da hepatite crônica C

José Carlos Ferraz da Fonseca


Médico especialista em doenças do fígado (Hepatologia)

No Brasil, o tratamento atual da hepatite crônica C estaria ainda   baseado na associação clássica de duas drogas: o interferon peguilado e a ribavirina. O percentual de resposta virológica sustentável, ou seja, HCV-RNA negativo no soro (carga viral negativa do vírus da hepatite C) após seis meses do termino do tratamento (provável cura da infecção) é menor que 50% entre portadores do genótipo 1 do VHC. Por outro lado, entre portadores do genótipo 2 ou 3, a resposta virológica sustentável alcança percentuais bem maiores, que variam de 70% a 90%. Portanto, como podemos observar, mesmo após o tratamento, um número significativo de pacientes tratados permanecem positivos para o VHC e com doença hepática crônica progressiva. Na maioria dos casos, retratá-los com IFN peguilado + ribavirina tem sido frustrante, observando-se um percentual muito baixo de cura, variando 2% a 14%. O problema maior no retratamento é o aparecimento de resistência do VHC ao interferon.

Diversos fatores contribuem para o insucesso do tratamento atual e os principais seriam: resistência do VHC ao interferon peguilado; portadores do genótipo 1; redução das doses do interferon peguilado ou ribavirina em decorrência dos efeitos colaterais gravíssimos que ocorrem durante a terapia (anemia, queda acentuada no sangue das células brancas - leucócitos, depressão, síndrome do suicídio); suspensão definitiva da terapia antes do tempo previsto.

Desde 2001, ano da publicação dos primeiros trabalhos científicos sobre o uso da associação do interferon peguilado + ribavirina no tratamento da hepatite crônica C, a pesquisa de novas tem sido extenuante e os resultados finais (fase III) de alguns estudos tem sido animadores. Recentemente (outubro/novembro 2010), durante o congresso (Boston, MA) da Associação Americana de Estudos de Doenças do Fígado (AASLD), do qual participei, foram apresentados os resultados de diversos estudos (fase III) com duas novas drogas “inibidoras de protease”, denominadas farmacologicamente como telaprevir e boceprevir. As referidas drogas, de uso oral, foram sintetizadas por dois laboratórios internacionais, Vertex Pharmaceuticals e Merck &Co.,Inc. (MSD), respectivamente.

Podemos considerar os resultados como excelentes quando uma das drogas, seja o telaprevir ou boceprevir, foi associada ao interferon peguilado + ribavirina, principalmente entre pacientes virgens (naives) ao tratamento. Observa-se nesses estudos, o aumento bem maior da resposta virológica sustentada entre pacientes tratados portadores do VHC com genótipo 1. Todavia, os efeitos colaterais da associação interferon peguilado+ ribavirina + boceprevir ou telaprevir foram exacerbados, principalmente relacionados a anemia. De acordo com os autores desses estudos, índices percentuais muito grandes de anemia grave foram responsáveis pela descontinuidade do tratamento. Portanto, é importante frisar que quando iniciarmos o tratamento como uma das novas drogas, todo o cuidado é pouco e devemos priorizar o monitoramento do quadro hematológico do paciente.

Entre pacientes tratados previamente com interferon peguilado + ribavirina e considerados não respondedores (HCV-RNA positivo durante e após tratamento), o uso do telaprevir ou do boceprevir associado ao esquema clássico (interferon peguilado+ribavirina) revelou aumento considerável nas taxas de resposta virológica sustentável (HCV-RNA negativo no sangue após seis meses do termino do tratamento).

Em 2011 foi lançado duas novas drogas no tratamento da hepatite crônica C, telaprevir e boceprevir. Os resultados foram animadores, contudo os efeitos colaterais das duas novas drogas são preocupantes. Recentemente, o Ministerio da Saúde do Brasil liberou as duas novas drogas, sendo a droga Telaprevir a de primeira escolha.. Temos a certeza de que com o advento dessas duas novas drogas, teremos em mãos mais uma arma no arsenal terapêutico contra a hepatite crônica C, apesar dos efeitos colaterais.

Mais recentemente, abril de 2013, foi publicado na revista médica "The New England Journal of Medicine" os resultados de uma pesquisa com uma nova droga denominada de "Sofosbuvir" associada somente a Ribavirina, sem uso do Interferon peguilado, cujos resultados revelaram percentuais de cura (resposta virológica sustentada)  de 78%. O tratamento foi realizado entre pacientes portadores dos genótipos 2 ou 3, com tratamento prévio (Interferon peguilado + Ribavirina) e sem resposta terapêutica. Os efeitos colaterais encontrados foram dor de cabeça, fadiga, insonia e náuseas. Somente em 1% a 2% dos pacientes foi necessário suspender o Sofosbuvir.

Em maio de 2013, novo trabalho, também publicado  na revista científica  "The New England Journal of Medicine"revelou que a associação dessa nova droga 'Sofosbuvir" com a Ribavirina, agora utilizada entre pacientes portadores do genótipo 1, o percentual de resposta virológica sustentada (cura)  foi maior que 80%. Para o paciente, o mais importante no tratamento com a associação Sofosbuvir +Ribavirina é que ele não precisa tomar o Interferon peguilado (injetável). O mais importante ainda, é o tempo de tratamento, que seria não mais do que 16 semanas (4 meses).

Na Semana da Doença Digestiva (Digestive Disease Week- DDW) realizada em maio de 2013 nos Estados Unidos da America, do qual participei, os comentários e palestras cientificas sobre a nova droga "Sofosbuvir" foram o de esperança na "cura total" da hepatite cronica C, e que assim seja.

Vários estudos publicados nos últimos três anos anos revelam que a associação de diversas drogas  inibidoras da polimerase resultam em percentuais de cura de até 100%, com tempo de tratamento variando de 12 semanas a 24 semanas. Portadores do genótipo 1 do VHC (grupo mais difícil de tratar), quando tratados com a associação  Sofosbuvir + Ledispavir por via oral, alcançam percentuais de cura (não cirróticos) de 99% e entre pacientes com cirrose este percentual de cura variou de 94% a 99%.
A associação das novas drogas Daclatasvir + Sofosbusvir,  Ledispavir + Sofosbuvir ,  Simeprevir + Sofosbuvir, Simeprevir + Daclastavir + Ribavrina (esquema triplo), Ledipasvir + Sofosbuvir + Ribavirina (esquema triplo), resultam em percentuais de cura em até 100% dos casos tratados. Todavia, a indicação destas novas drogas devem ser cuidadosamente avaliada pelo médico assistente, sempre tendo como orientação o consenso e protocolo das diversas associações para o estudo do fígado no mundo, tais como: Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH); Associação Europeia (EASL) e Americana (AASLD). No Brasil, sempre nos orientamos e tomamos decisões no tratamento da hepatite crônica C,  respeitando o Protocolo do Ministério da Saúde.

Diversas drogas estão sendo pesquisadas e já se encontram  em fase final (fase III) com resultados animadores, sem maiores efeitos colaterais, tempo menor que 24 semanas de tratamento, com altos percentuais de cura e  resposta virológica sustentada duradoura. Que venham tais drogas...