José Carlos Ferraz da Fonseca
Médico
Especialista em Doenças do Fígado (Hepatologia)
A maconha (Cannabis sativa) é cultuada
em todo o mundo, apesar do uso ser considerado ilegal em vários países,
inclusive no Brasil. Quando fumada, é usada como droga
relaxante ou para fins de provocar efeitos eufóricos. O emprego medicinal da
maconha é aprovado em alguns países do mundo, mas discute-se cientificamente se
seus efeitos realmente beneficiam ou viciam seus usuários.
Deleitada,
na maioria dos casos, por adolescentes, jovens e adultos jovens, a maconha é
também utilizada pelos mais velhos. Vejam este exemplo: tenho um paciente, com mais
de 75 anos, usuário costumeiro de um “baseadinho” por dia. Suas filhas vivem em
pânico, pois ele tem, na laje de sua casa, um pé de maconha. Um só pezinho para
uso próprio, confessa. Agora, se o meu distinto paciente fuma seu cigarrinho de
maconha há mais de 60 anos, que posso fazer como médico? Apenas expliquei os
males da referida droga ao usuário, não só para o seu fígado, como também para
o seu pulmão. Contudo o mesmo foi enfático, ao final da consulta, dizendo: "não
posso largar uma das boas coisas da vida, certo doutor? Veja só meu dilema, carne
vermelha não como mais, sal e sexo só quando sonho, entendeu meu doutor?".
Depois dessa famigerada e consistente resposta, acabei fazendo-me de desentendido,
apesar dos olhares perplexos das duas filhas.
Fumar
um “baseado” faz mal ao fígado? É a pergunta que mais recebo no meu blog. Com certeza, posso afirmar que
sim, mas não tanto como a cocaína. O que se sabe cientificamente é que um dos
princípios ativos liberados pela maconha, denominado de “canabinoide”, é
dividido em dois receptores, “canabinoides receptores 1 e 2”. O canabinoide
receptor 1 é o grande vilão da história natural dos usuários da maconha, pois, geralmente,
compromete o fígado. Se o uso é associado
ao consumo de álcool, essa substância (canabinoide) torna-se mais agressiva e é
capaz de levar a problemas gravíssimos no fígado.
Diversos
trabalhos publicados em revistas médicas e científicas relatam os efeitos
nocivos do uso diário da maconha em forma de cigarro, principalmente entre
pacientes com doença hepática preexistente, citando como exemplos: hepatite
crônica ocasionada pelo vírus da hepatite B (VHB) ou C (VHC); esteatose
hepática; esteato-hepatite não alcoólica, cirrose hepática alcoólica, cirrose
hepática sem causa definida.
O
que acontece entre esses pacientes (usuários de maconha) com hepatopatia preexistente?
A substância liberada pelo uso da maconha, no caso a “canabinoide”, é capaz de
atuar como “fator de risco” na progressão mais rápida para fibrose
(endurecimento) do fígado, no curso dessa doença (caminho para a cirrose),
principalmente, entre pacientes com hepatite crônica C.
Baseados
nos estudos supradescritos, podemos concluir que todos os pacientes com doença
hepática preexistente devem reduzir ou se abster totalmente do uso da maconha.
Não devemos esquecer, também, que o uso do álcool, associado ao ato de fumar
maconha, é muito mais agressivo ao fígado doente ou até sadio. Portanto tudo
depende do seu gosto ou de sua opção ao vício, ou seja, fácil de entrar e
difícil de sair!
Por
favor, senhores usuários da maconha ou simpatizantes, sempre me julguem pelas
minhas perguntas do tipo: “fumar um baseado faz mal para o fígado?”. E nunca
pelas minhas respostas: faz e muito...
2 comentários:
Genial Dr. José Carlos Fonseca. Seu artigo sobre a maconha e o fígado é digno dos maiores elogios. Parabéns, o senhor cada dia torna-se mais sábio.
Um fã de carteirinha
Grato pelo aprendizado , Ótimo texto e publicação
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